Senadores oposicionistas têm apresentado propostas para que os empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a outros países sejam proibidos, ou que sejam analisados pelo Senado para que possam ocorrer. As iniciativas são uma reação a declarações recentes do presidente Luís Inácio Lula da Silva em defesa de que o BNDES volte a financiar obras no exterior.
Para os parlamentares, essas providências são necessárias porque, no passado, alguns países, como Venezuela, Cuba e Moçambique, não pagaram empréstimos que receberam. Como os financiamentos têm a garantia do governo do Brasil, os calotes acabam ficando por conta do Fundo Garantidor à Exportação (FGE). O governo entende que os financiamentos dão lucro ao BNDES e geram empregos e renda no Brasil, a partir da exportação de bens e serviços de engenharia e de outras áreas a cargo de empresas nacionais.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) defende que qualquer empréstimo externo do BNDES com linhas superiores a U$ 100 milhões tenha aval do Senado para que possam ser efetivados (PRS 19/2023). Para ele, além dos riscos econômicos, é preciso também levar em conta os riscos políticos nestes empréstimos.
Segundo o projeto, as análises teriam como base escalas de risco de organizações internacionais ou de agências de avaliação de riscos. Seriam previamente proibidas quaisquer linhas de crédito para países inadimplentes durante 10 anos. Ficariam dispensados deste rito de análise apenas as exportações de bens e serviços de defesa.
“Essa proposição tem inspiração, com naturais adaptações, no que já ocorre nos casos de garantia da União em operações de crédito para entes subnacionais, que devem ser aprovadas caso a caso por esta Casa”, explica Flávio Bolsonaro na sua justificativa para o projeto.
Já Plínio Valério (PSDB-AM) apresentou uma proposta (PL 87/2023) que proíbe o BNDES de conceder crédito a governos estrangeiros e de prorrogar a validade de operações dessa natureza que já estejam contratadas. A exceção permitida é o financiamento da exportação de bens e serviços produzidos no Brasil. Plínio entende que aplicar os recursos no exterior é “inaceitável e revoltante”, com os “duros” problemas no Brasil a serem resolvidos.
Na justificativa, Plínio cita que as linhas de crédito destinaram, apenas nos anos de 2013 e 2014, R$ 3 bilhões para a Venezuela, R$ 3 bilhões para Angola e R$ 800 milhões para Cuba. Além disso, outros R$ 230 milhões foram para Gana, R$ 212 milhões para a Bolívia e R$ 188 milhões para Benin, além de outras linhas de crédito para Argentina, República Dominicana e Moçambique.
“As dívidas em atraso de Venezuela e Cuba somam US$ 909 milhões, o equivalente a R$ 4,6 bilhões. Deste montante, US$ 855 milhões foram ressarcidos pelo FGE, o equivalente a R$ 4,3 bilhões. Mas o FGE é vinculado ao Tesouro, são recursos de tributos recolhidos dos brasileiros”, reclama.
Na prática, o projeto de Plínio aproveita relatório que ele ofereceu a um projeto sobre o mesmo tema (PLS 261/2015). O texto foi aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) em 2019, mas acabou não tendo andamento em outras comissões e foi arquivado ao final da legislatura. A permissão do apoio a produtos brasileiros reproduz emendas da ex-senadora Kátia Abreu, acolhidas por Plínio, que visavam não prejudicar a indústria brasileira.
O senador Cleitinho (Republicanos-MG) também quer que qualquer empréstimo externo do BNDES passe antes pelo Senado para que possa se efetivar (PRS 13/2023). Para ele, a “falta de transparência” no uso do dinheiro público para financiar obras no exterior “gera revolta entre brasileiros”.
Outra iniciativa partiu do senador Izalci Lucas (PSDB-DF). Ele solicita ao vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento, Geraldo Alckmin, um histórico sobre os empréstimos (RQS 10/2023). Para Izalci, é contraditório o BNDES financiar obras fora do Brasil enquanto a infraestrutura nacional fica para trás.
“Estados e municípios enfrentam dificuldades para obter financiamentos similares para suas obras. Para um país como o Brasil, onde sabemos que a escassez de poupança é um problema, a conclusão parece bem simples: o dinheiro que financia a infraestrutura no exterior deixa de estar disponível para financiar infraestrutura no Brasil”, questiona Izalci.
Governo
O presidente Lula sugeriu que os calotes de Venezuela e Cuba se deram devido a divergências diplomáticas com o Brasil a partir do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016. Para ele, como os países são “nações amigas”, voltarão a honrar seus compromissos. As declarações foram feitas na cerimônia de posse de Aloizio Mercadante na presidência do BNDES, em fevereiro.
Em 2020 o Brasil rompeu formalmente as relações com a Venezuela, pois o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro não reconhecia Nicolás Maduro como presidente do país. O Brasil também está sem embaixador em Cuba desde 2016, e vice-versa, a partir do mandato de Michel Temer na presidência da República.
Agência Senado (Reprodução autorizada mediante citação da Agência Senado)